domingo, 20 de novembro de 2011

A medalhinha do Zezé

Athos Ronaldo Miralha da Cunha
twitter.com/athosronaldo

Nas mudanças internas da agência o segmento penhor foi rebaixado em dois andares. Mas as mudanças acontecem para melhor. O atendimento ficou mais discreto com um anteparo entre os guichês para os clientes não ficarem bisbilhotando os penhores dos outros.
Então, a senhorita Doroteia – era assim que a jovem cliente de 44 anos gostava de ser chamada – chegou ao guichê com um sorriso silencioso e com o dedo indicador fazendo voltas no ouvido. Coisa de doido! Sussurrava algo que não consegui ouvir e apontando para a cliente ao lado. O interessante que com o indicador fazia as voltas no ouvido e apontava com o polegar. Falava tão baixinho que custei a entender.
– Me deve...
– !?
– É louca...
– !?
Pediu uma folha de rascunho. Entreguei uma folhinha do bloco de anotações –, aquele que fomos brindados com o Sinergia – e alcancei para a senhorita Doroteia.
Baixou a cabeça e me entregou o bilhete junto com as joias a serem penhoradas. O lote era formado por duas pulseiras-argola, um pendente e o bilhete com os dizeres “ex-colega, rabugenta e me deve”. Olhei para a senhorita Doroteia e ela estava sorrindo. Sorria apontava com o polegar para o guichê ao lado.
– Duas pulseiras e um pendente – falei.
– A medalhinha do Zezé.
É lógico que quando ela falou “medalhinha do Zezé” eu comecei a cantarolar a marchinha de carnaval “Olha a cabeleira do Zezé, será que ele é”. Mas eu acho que não é ouro... testei.
Havia ganhado a medalhinha do Zezé num show da dupla sertaneja Zezé di Camargo e Luciano. Está com dó de penhorar a medalhinha. Ela quase desabou da cadeira quando eu devolvi afirmando.
– Não é ouro... é biju!
– Mas que cachorro esse Zezé.
– E tem mais. As pulseiras são da Bruna.
– Da Bruna?
– Biju da Bruna Lombardi.
– Mas que cachorra essa Bruna.
Levantou-se abruptamente e se foi. Sem olhar para trás rodopiou o indicador no ouvido.
A senhora “ex-colega e rabugenta” levanta e vem falar comigo.
– Aquela moça que o senhor atendeu...
– A senhorita Doroteia?
– Senhorita? Faz cinquenta anos que ela senhorita. Senhorita falcatrua, isso que ela é.
Esboçou um sorriso irônico e voltou para o guichê onde estava sendo atendida.
Em poucos segundo voltou para meu guichê.
– Estávamos num show em Porto Alegre. O Zezé di Camargo me atirou uma medalhinha de presente e a senhorita – e fez com as mãos o sinal de aspas – se atirou na minha frente e pegou a medalhinha.
As rusgas estavam explicadas. Voltou para o seu posto e espero que em definitivo, pois a colega já terminava a avaliação. Então, ouvi a seguinte frase sobre as joias da “ex-colega e rabugenta”.
– Suas pulseiras são bijuterias. Não dá penhor...

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