quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

O penhor do Pinto Rosa *

Certa tarde, de um dia quente desse nosso verão escaldante, entra no recinto do penhor, um senhor alto, todo banhado em suor. Um gringo magro do interior de Anta Gorda com uma larga vivência urbana, esperto e conversador. Dirige-se diretamente ao avaliador de penhores, que estava absorto na leitura de um informativo do sindicato com notícias sobre as negociações salariais.
- Boa tarde, moço.
- Boa tarde.
- Aqui dentro tá fresquinho, não imagina como está lá fora. Chove torrencialmente, olhe como estou molhado. – e sorriu de sua própria piadinha.
- Águas caindo. - retorquiu o avaliador, mas o vivente não entendeu o trocadilho.
Queria obter informações sobre o penhor, suas vantagens, desvantagens e se as jóias estariam seguras no banco. Tinha muito medo de roubo e não queria amargar a perda de suas jóias que possuíam um grande valor de estimação, sendo que algumas delas vieram da Itália quando seus avós migraram para o sul do Brasil.
Após obter as informações necessárias e ser tranqüilizado acerca de tal operação e de sua segurança, disse que já era cliente do penhor de uma agência em Porto Alegre, mais precisamente o posto de Penhor da Praça da Alfândega.
- Então o senhor vai trazer suas jóias de Porto Alegre? O senhor deseja pagar o resgate?
- Não, eu já estou com elas aqui... eu quero fazer o penhor.
- O senhor vai fazer o penhor hoje?
- Sim.
- Então, vou precisar da sua Carteira de Identidade, do CPF e de um comprovante de residência.
O seu Valphrido Pinto Rosa passou a documentação para o avaliador. Para entregar as jóias a serem avaliadas, pediu licença, levantou-se, virou um pouco de lado, de frente para a parede.
- Tem que ser meio “escondidito”. – comentou o senhor Pinto Rosa, que naquele momento estava num vermelhão só.
Abriu o zíper da calça, todo desajeitado e atrapalhado, enfiou a mão com uma certa demora, talvez pelo difícil acesso. Antes mesmo de o avaliador, meio assustado, dizer que “pinto” a Caixa ainda não aceitava como garantia para fins de empréstimo, mesmo que dito cujo fosse rosa, o cidadão, ali em frente, retirou de dentro de sua calça um pacote envolto em papel branco e amarrado com atilhos.
- Quero penhorar estas jóias. E tem aí um baita diamante rosa de um quilate. – falou como se tivesse lido os pensamentos do avaliador.
- Ahãn... ahãn... – grunhiu o avaliador duvidando do gringo.
Largou o pacote em cima da mesa e mais que depressa fechou o zíper e estatelou-se na cadeira. Agora o senhor Pinto Rosa estava branco como uma folha de papel. O suor corria-lhe pela testa, embora o ar condicionado do ambiente estivesse funcionando normalmente. Nesses tempos de dólares em cuecas, que mal teria um valioso diamante rosa na cueca do seu Valphrido Pinto Rosa?
O avaliador, com o constrangimento devido a tal situação ser inusitada num posto de penhor, solicitou, com a maior delicadeza possível.
- O senhor desfaça o pacote, por gentileza.
Provavelmente com um pouco de receio em tocar no invólucro branco e suado das jóias, que certamente ladrão nenhum jamais encontraria.
Com uma análise rápida e visual, o lote, de seis anéis, um deles com o tal diamante rosa, três colares e quatro pulseiras, foi considerado como jóias de ouro 18 quilates e em bom estado de conservação. Pularam da mesa para a balança e da balança para o envelope com o lacre da Caixa, o mais rápido possível. Total da avaliação R$ 1.860,00.
E o seu Valphrido Pinto Rosa saiu do penhor cheio dos pilas, diga-se de passagem, com toda a grana na cueca.

* Classificada no Concurso Histórias de Trabalho 2007

Um comentário:

ADRIANA RAMBALDI disse...

Athos, parabéns pelo seu blog!! Ficou ótimo! Mas esta do "Pinto Rosa" foi a melhor história do penhor que já ouvi. Cheguei a chorar de rir. Parabéns!


Adriana Rambaldi
Agência Pouso Alegre/MG